Debates
Faltou a população fazer sua parte
Da Redação | 24 de agosto de 2017 - 01:14
Por Luiz Carlos Borges da Silveira
Passado o episódio da votação de admissibilidade da denúncia
contra o presidente Michel Temer por corrupção, cabe uma análise criteriosa sem
influência do calor dos fatos relativos à sessão na Câmara Federal. Perdura o
questionamento: por que o presidente saiu ganhador no embate legislativo,
quando evidências e provas eram-lhe desfavoráveis? A resposta tem muitas
variantes e argumentos. Sabidamente, aconteceu o que é costumeiro acontecer,
houve a manobra política do governo com distribuição de benesses, inclusive
liberação de emendas orçamentárias, na ‘undécima hora’, a parlamentares
negocistas.
Todos os argumentos tentando justificar o resultado do
episódio são aceitáveis, todavia no meu entendimento o elemento decisivo foi o
desinteresse da sociedade que mesmo com algum grau de indignação diante dos
fatos permaneceu alheia ao ponto central da questão. Acredito que se houvesse
mobilização e vigorosa tomada de posição o desfecho seria outro. É bom recordar
casos anteriores na nossa história política. Quando o então presidente Fernando
Collor enfrentou processo de cassação e mais recentemente no impeachment de
Dilma Rousseff o povo foi para as ruas, mobilizou a opinião pública e exerceu
legítima pressão. No caso atual a denúncia e as provas apresentadas mostravam
ser a situação de Michel Temer tão ou mais grave do que nos exemplos citados.
Temer estava mais complicado (e ainda não se encontra
totalmente a salvo, há expectativa de que nova denúncia poderá ser
apresentada), havia entendimento generalizado de que teria de ser punido, tanto
que o governo mobilizou todas as forças disponíveis para neutralizar o
processo, o que resolveu, o presidente acabou poupado, mas ficou o sentimento
de frustração.
A pergunta é “por que o povo não saiu às ruas”? A conclusão
pode ser preocupante: estará o povo desiludido, descrente de mudanças que
possam recuperar a decência política?
Claro está que o desfecho da votação foi favorecido pelo
próprio processo político, pois a oposição (leia-se PT e seus aliados) não foi
enfática, preferindo prolongar o desgaste do presidente, certamente antevendo o
pleito de 2018. Exponenciais lideranças empresariais igualmente se mantiveram
distantes, assim como setores que concentram notórios formadores de opinião.
O fator decisivo em favor de Temer foi a ausência do povo
nas ruas. A pressão popular funciona mesmo, tem força, pois os políticos,
especialmente deputados, no caso, tomam cuidado em não contrariar a vontade
popular. Muito provavelmente, se os brasileiros fossem às ruas a maioria dos
deputados teria votado diferente. A apatia popular sinaliza para algo
preocupante porque a descrença ou acomodação não ajudará em nada nas mudanças,
principalmente éticas, que o país carece.
Politicamente as coisas se aquietaram e o governo está
tentando implementar as reformas estruturais, portanto tem seus méritos. Porém,
uma administração adequada não isenta nenhum governante de sofrer sanções
quando cometer erros, notadamente se estiverem ligados a crimes como corrupção.
No caso em foco, por justiça Michel Temer deveria ser condenado, julgamento que
leva em consideração a boa gestão em detrimento da lisura e da decência é
completamente errado. Acredito que se o povo houvesse se conscientizado disso
teria se manifestado com vigor. Se a voz da sociedade se calar podem acontecer
coisas piores.
Para evitar que isso aconteça o povo tem de ter pleno convencimento do peso de sua participação e da força de sua pressão. Grandes mudanças e importantes correções de rumos aconteceram a partir do engajamento popular, afinal, uma das definições da democracia é ‘governo do povo, pelo povo e para o povo’.
Luiz Carlos Borges da Silveira é empresário, médico e professor. Foi Ministro da Saúde e Deputado Federal.