Paulo Coelho
Por que Paulo Coelho tem sucesso?
Mario Martins | 14 de janeiro de 2017 - 03:16
Essa é a pergunta que mais escuto, de
jornalistas do mundo inteiro. Mas se o leitor acha que consigo respondê-la, é
melhor parar de ler o artigo por aqui. O meu processo de criação vai contra
tudo aquilo que se convencionou chamar de “receita do sucesso.”
Em primeiro lugar, porque que não sigo uma
fórmula temática em meus livros: O diário de um mago e As Valkírias, por exemplo, tratam diretamente de espiritualidade,
enquanto O Alquimista e Veronika decide morrer sequer tocam no assunto. Além
disso, a inserção de personagens no tempo varia muito; em O monte Cinco estamos
alguns séculos A. C. ; Na margem do rio Piedra sentei e chorei acontece no
presente, enquanto O Alquimista e O demônio e a Srta. Prym não fazem qualquer referência à época.
Há gente que diga que é marketing: ora, os
meus primeiros dois livros (Diário de um mago e Alquimista) já tinham vendido
mais de 250.000 cópias quando a editora colocou o primeiro anúncio. O mesmo
ocorreu no exterior: os editores estrangeiros só se aventuraram a investir no
desconhecido autor brasileiro, quando viram o que acontecia aqui – e mesmo
assim, sem muita convicção, argumentando que “o que acontece em um país, pode
não acontecer no outro.”
Então, se existem contradições de tema e de
espaço, e se o marketing era inexistente na fase crítica – em que os primeiros
livros saíram sem qualquer alarde – onde reside o segredo?
Segredo, não existem nenhum. Mas existem
três fatores que, no meu entender, fazem
com que “o universo sempre conspire a favor de quem quer realizar um sonho.”
O primeiro fator: é preciso estar
absolutamente convencido daquilo que se está fazendo. A partir do momento que
decidi viver de literatura, deixei de lado todas as outras possibilidades de
subsistência. Parei meu trabalho como letrista de música, roteirista de TV,
jornalista, e resolvi apostar toda a minha energia naquilo que me dava alegria
de viver. Como todas as outras pessoas, tinha família para sustentar, mas minha
família me apoiou – porque o amor sempre
é a força maior atrás de qualquer iniciativa.
O segundo fator: você não consegue jamais
realizar um sonho sozinho, portanto encontre os seus aliados. E meus aliados
foram os leitores que, através do boca-a-boca, conseguiram difundir o trabalho
de um escritor desconhecido. Se alguém gosta do que leu, irá recomendar o livro
ao seu amigo, namorado, filho. O apoio inicial a partir do leitor também
protege o autor dos eventuais ataques da imprensa; como já tomou conhecimento
do trabalho, julgou e recomendou, quando
estiver diante de uma crítica negativa, irá lembrar-se de seu próprio
julgamento, e não se deixará influenciar.
Finalmente: descubra uma maneira pessoal de
compartilhar o seu sonho. Isso, em literatura, é chamado de estilo. Procurei
falar de temas antigos, usando uma linguagem moderna. Os manuscritos originais
tinham quase o triplo de páginas, mas eu me obriguei a acreditar que o leitor
era capaz de utilizar sua imaginação na construção dos cenários, de modo que me
limitei a narrar os conflitos dos personagens. A experiência provou que eu não
estava errado.
Um autor tem que correr riscos: não pode
deixar-se escravizar pelos temas, na esperança de agradar a quem o lê. Precisa
ser honesto naquilo que escreve, e transparente consigo mesmo – porque o leitor
perceberá quando estiver diante de um romance escrito apenas para satisfazer as
“tendências de mercado”, e vai sentir-se traído. Eu nunca posso prever o que
milhões de leitores no mundo inteiro, em culturas diferentes, irão pensar
daquilo que estão lendo; conseqüentemente, escrevo para a única pessoa com quem
tenho certa intimidade – eu mesmo.
Quando começo um livro, travo o duro
combate entre quem sou, e que parte gostaria de melhorar em mim mesmo. Qualquer
atividade criativa é uma aventura dolorosa e fascinante ao mesmo tempo: por um
lado existe o medo de descobrir nossos próprios fantasmas, por outro está a
excitação de saber que somos mais interessantes do que pensamos.
E para este mergulho na alma, é preciso um processo criativo bem definido, do qual falaremos na próxima semana.